Companhia aérea poderá cobrar até 50% do valor proporcional da passagem do tutor pelo transporte
A Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou nesta terça-feira (17) um projeto de lei que regulamenta o transporte de animais domésticos de pequeno porte em voos que cheguem, partam ou façam conexão no estado. Batizada de Lei Pandora, em homenagem a uma cadela extraviada no final de 2021, ela segue agora para sanção ou veto do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).
O projeto estabelece como animal de pequeno porte aquele que não ultrapasse os 15 kg e permite o transporte de até dois pets por passageiro e no máximo dez por aeronave. Se aprovada, a lei determinará que o animal deve ocupar um assento do avião e, por isso, a companhia poderá cobrar até 50% do valor da passagem do tutor pelo transporte.
Além disso, o animal deve ser transportado em uma caixa com condições de habitabilidade — seguindo os padrões das empresas aéreas e dos respectivos órgãos —, ser alimentado e hidratado a cada quatro horas e devidamente higienizado. A regra valeria tanto em linhas nacionais quanto internacionais.
Para embarcar no voo, o animal deve ter atestado veterinário emitido há menos de 15 dias que demonstre boas condições de saúde, carteira de vacinação atualizada e guia de Transporte Animal (GTA) emitido pelo Ministério da Agricultura e da Pecuária (MAPA) ou órgão conveniado, além dos demais documentos exigidos pela companhia aérea.
A votação foi feita a partir do Projeto de Lei 587/2023, do deputado Caio França (PSB), com coautoria de Ricardo França (Podemos) e Rafael Saraiva (União Brasil).
Para os animais que forem transportados no compartimento de carga, os aeroportos deverão se atentar à espera máxima de uma hora entre o despacho e a decolagem da aeronave. Antes do embarque, por até 30 minutos, eles deverão ser acomodados em sala climatizada, com ventilação apropriada e proteção contra umidade e calor.
No interior do compartimento de cargas, é preciso haver iluminação, temperatura e pressão controladas, além de estrutura para redução de ruídos e espaço apartado das demais bagagens.
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Além disso, transportes que acarretem em óbito ou fuga dos animais domésticos — com partida, chegada ou conexões no estado — são estabelecidas multas para as empresas aéreas. O valor é de 1 mil Unidade Fiscal do Estado de São Paulo (UFESP), atualmente equivalente a R$ 35.360.
Caso haja reincidência dentro de 30 dias, a multa poderá ser aplicada em dobro. De acordo com o projeto, os valores arrecadados serão destinados a ações direcionadas à defesa animal.
Casos recentes
Batizada de Lei Pandora, a lei aprovada pela Alesp faz referência ao caso da cachorra Pandora, de dezembro de 2021. Ela ficou desaparecida por 45 dias em conexão no Aeroporto Internacional de Guarulhos, na Grande São Paulo. A viagem, feita pela Gol, seria de Recife (PE) para Navegantes (SC).
Durante o desaparecimento, o tutor da cadela, o garçom Reinaldo Gomes Júnior, mobilizou diversos perfis nas redes sociais e chegou a oferecer recompensas para quem encontrasse pistas de seu paradeiro. Em fevereiro de 2022, Reinaldo entrou com uma ação na Justiça de São Paulo pedindo indenização de mais de R$ 320 mil à companhia pelo extravio. No processo, a Gol alegou que gastou mais de R$ 25 mil ao contratar empresas de busca.
Na época, a Justiça determinou que a Gol deveria arcar com gastos com hospedagem, alimentação e transporte dos donos por pelo menos 15 dias. O Aeroporto de Guarulhos também precisou arcar com as despesas do tratamento veterinário e da internação de Pandora, que tratou uma desnutrição severa causada no período.
Já em abril de 2024, o cão Joca, golden retriever de cinco anos, morreu após erro no transporte da mesma companhia. A viagem deveria ter sido de Guarulhos para o aeroporto de Sinop, no Mato Grosso. No entanto, o animal foi embarcado por engano em voo que seguia para Fortaleza (CE). O caso gerou comoção e protestos nas redes sociais.
A viagem, que deveria durar cerca de duas horas e meia, demorou quase oito horas e, ao chegar no destino errado, Joca ainda foi encaminhado de volta a São Paulo. Segundo a família, no aeroporto de Fortaleza, o cão ficou cerca de uma hora e meia aguardando sob o sol, sem poder sair da caixa onde foi transportado, além de não ser alimentado e hidratado.
Em outubro, o inquérito policial que investigava o caso foi arquivado. Na decisão, o juiz do caso alegou que não havia “elementos aptos a demonstrar a ocorrência de maus-tratos e sofrimento do cão Joca em razão desta circunstância. Os funcionários que tiveram contato com Joca após sua chegada em Fortaleza noticiaram que ele estava bem e calmo, sem aparente situação de estresse”.
Após a morte do cão, o Governo Federal implementou novas diretrizes para o transporte de animais em aviões do país — alinhadas com práticas internacionais. O programa, chamado de Plano de Transporte Aéreo de Animais (PATA), segue as diretrizes da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Casos de extravio e morte de animais em aviões não são inéditos no Brasil, levando companhias aéreas a acumularem condenações judiciais.
O cachorro Weiser, um american bully, morreu em um voo da Latam em 2021. No Aeroporto de Guarulhos, ele foi transportado em uma caixa de madeira às 8h, mas a decolagem para Aracaju (SE) seria apenas às 12h30. Nesse período, o animal não teve acesso a água e comida e não pôde sair da caixa. Ao chegar em Aracaju, seu tutor, o engenheiro civil Giuliano Conte, recebeu a notícia de que Weiser tinha morrido na viagem.
A companhia aérea alegou que não houve falha no transporte, mas uma “fatalidade em razão das características naturais da raça do cão”.
Em setembro de 2023, no julgamento do caso, a juíza Carolina Bertholazzi pontuou que o laudo médico evidenciava que fragmentos da madeira da caixa foram encontrados no estômago do cão. Foi fixado pagamento de danos materiais em R$ 2.097,36, além de danos morais em R$ 10 mil.
Também em 2021, ocorreu o caso de Zyon, filhote de golden retriever de apenas dois meses e quatro dias de vida. Apesar do voo da Latam, de Guarulhos ao Rio de Janeiro, ter decolado às 13h e pousado às 13h52, a tutora do cachorro, Gabriela Duque, só teve acesso a ele às 15h30. Nesse período, Zyon teria ficado exposto ao sol e sem assistência, de acordo com a dona.
O animal foi levado a um veterinário pois tinha dificuldades para respirar e não respondia aos estímulos, e morreu às 23h do mesmo dia. A Latam negou qualquer falha no serviço. A juíza do caso, Adriana Cristina Paganini Dias Sarti, da 4ª Vara Cível de São Paulo, durante o julgamento em 2022, destacou que a companhia “não demonstrou ter adotado todas as medidas necessárias ao transporte e entrega do cão em perfeito estado, prevalecendo sua responsabilidade”. Foi fixada indenização de R$ 8 mil por danos morais. Não houve recurso.
A Varig foi condenada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), em 2015, a pagar R$ 6 mil em danos morais pela morte de um buldogue inglês. O animal, de 10 anos, viajava no porão da aeronave, de São Paulo a Paraíba. O cachorro tinha atestado veterinário que o permitia realizar viagens frequentes, pois participava com de diversos torneios. Na ocasião, ele ia à Paraíba para cruzar com uma fêmea da mesma raça.
Outro caso de morte de animais ocorreu em dezembro de 2019, em viagem de Guarulhos para Vitória (ES). O analista David Canuto, ao chegar no aeroporto, esperou mais de 40 minutos para encontrar seu cachorro Tom, que foi transportado no porão do avião. No local, uma funcionária lhe informou que o animal chegou no destino sem sinais de vida.
O laudo necroscópico do caso demonstrou que a causa morte foi hipertermia — ou seja, excesso de calor. Apesar do processo contra a companhia aérea, David foi indenizado em R$ 2.225 em danos morais, a fim de custear o sepultamento do cão e seu transporte aéreo.